sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Des-espelho

ás vezes o mundo fica pequeno
inerte, passivo
numa voz que cala e silencia por existir
e na imensidão do escuro
conquistando-se o pouco, o tudo
balançará-me a rouquidão de uma voz
abstendo-se do barulho.
e haverá um des-espelho
que indicará o sumiço
o imundo
que nem conceitos conseguirão
existir
a paralisação, a distancia
o amar-se, e calar-se
e afastar-se
não
não quero
mas há de haver um momento
que construído ou não
haverá de ser.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Travesseiro.

Havia um grito em mim. Que me acordava repentinamente todas as manhãs. Não avisava á ninguém. Só levantava, encarava aquela cópia barata de Modigliani, passando uns dez centímetros de uma A4, olhando-me com pescoços longos e olhos tristes e ia fazer um chá, um café ou qualquer um desses líquidos que por convenção toma-se pela manhã. Não sabia se era manhã.
Ás vezes acordava com o corpo doendo do wiskhy e algo em mim, talvez o primo do grito, repetia "acordar de ressaca do porre que tomou sozinho, João Ricardo, mas que merda heim, o fim da picada."
De vez em quando eu consentia e retrucava
-fazer o que? Se ninguém quis tomar um porre comigo. E olha que você nem é tão velho. Quarenta menos cinco. Porque se fosse mais cinco seria justificável.
Mas tinha uma barzinho com sinuca lá na esquina, passando o restaurante vegetariano que abriu, e como já parecia escuro quando acordei, não cairia mal aparecer por lá.
"É muita falta do que fazer, heim João Ricardo."
Mas eu vou. Vou mesmo assim.
Porque daqui a pouco o tempo fecha, começa a chover e corre o risco de ficar preso aqui pra sempre.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Quente

Susto. Mas não me importo
O sol bate quente na pele ainda
sozinha
mas no desencontro
me encontro
Súbito. Então me jogo
no que sou eu
e foi
fugindo em passos
pontas dos pés silenciosas
montando caminhos
estradas, conceitos
avenidas
vazias
ou repletas
Depende do som

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Filosofia

Perguntam-me, nesta imensidão do céu e da vida
qual linha quero seguir
pois confesso segurar em mim
o riso que sairia frouxo!
Mas que linha, ora nada
o mundo é feito de borrões e cores
de tragédias, lutas, amores
Não de linhas, ora essa
sigo à mim, ao mundo
sigo as estradas que a vida me leva
sigo o sorriso das crianças
o cheiro de café quente num país tropical
sigo a imensidão, a loucura
e a embriaguez noturna.
Sigo tudo, até quem pergunta
mas linhas
essas são filhotes
não de minha filosofia
mas de um quadrado
de quatro pontas
é pura perfeição
da geometria.

Trinca

Mas que arquitetura é essa, meu deus!
Que ainda ontem deixava mais verde os campos verdes
e fazia conspiração entre a corrente de todas as águas
essas que correm entre pedras, doces, sutis ou douradas.
Mas me diga que magia é essa
que afasta e desintegra corações
depois de tão desesperados
por não serem em apenas um
milhões.
Essa que me faz palpitar o sorriso
suspirar o respiro
e considerar os retratos.
Essa que faz da luz um momento
caindo leve e luva
ao sol que, embriagado
e confuso
não sabe mais se
nasce ou
se morre.
Mas que bobagem!
Que tolices essas palavras
risos são risos
e o sol será o sol
mesmo que a poesia
por fim,
acabe.

Nem nada

E eu que não sei se vou ou se fico
quando rodando não sei nem onde estou
Eu que surpresa, encontro um abrigo
naquilo que guarda a mim e não dois
Eu que em um pingo, quase suspiro de dor
mas discuto, traduzo
e invento outro amor
Ah, mas palavras
são só palavras
que mal educado
construí-las de
de
de
de outra cor.
São palavras, não são meu amor.
Mas não sei nem onde fico
aquietem os risos
são só palavras
não é meu amor.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Tapas

Rostos não mais impostos
que decompõem o pouco
que reconhecia. Caras
não mais pintadas, esperam surradas
no que não vivia.
Monstros desconhecidos
viram meus amigos
depois de retratados.
Retratos, todos antigos
são janelas frias
do que já foi amado.
Resto do rosto quadrado
e do esquecido
do duplificado
Tantas
são as outras caras
que a memória busca
mas do nada
falha.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Utopia

oh, tempos fúlgidos
tempos gastos
pare-me de fronte ao espelho
e veja o que sou agora
letra por lebre
que caminha para acompanhar
o relógio
esse estorvo de vida
que agora me persegue
traduz uns bons dias de verão
letra por letra
o segundo que constrói
minhas palavras
agora
já partiu

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Voo raso

Ah, mas que humildade
essa de deixar fugir as palavras
quantas já se foram e quantas por mim lamentei
mas sim, por que não
continuam poesias
essas, poesias de verdade
coloridas com o ar da liberdade
de não ter no que se aprisionar.
Oh, conceito infiel
esse que maltrata o ego
e me faz questionar
esse que me injustiça
fazendo-me em vão procurar
as palavras
que instigam o inexplicável
e acabaram de voar.