sexta-feira, 30 de março de 2012

Reflexo

Uma multidão silenciosa
que sussurra sabores em outras línguas.
Línguas que vem, línguas que vão; fazendo sutis o banquete dos apaixonados.
Esses que tem
e se mantém
eternamente
amados.
Sorte das mãos que entrelaçam-se a qualquer momento
e dos sonhos que dão tristeza de acordar.
Sorte, sorte. Momento.
Pra quem ligar?
A multidão incessante me espera,
e o silêncio também.
Que quebra, se quebra, despedaça.
Mas os traços silenciosos da escrita, me acolhem. E agora já sei em que braços deitar.

domingo, 25 de março de 2012

Aham

Respondia um grunhido qualquer só pra não ter que
permanecer durante muito tempo na conversa. Seu avô mesmo que dizia
"quando a gente vai falar com maluco, a gente concorda com tudo, qualquer coisa."
-Aham. Ele respondia
-As estatísticas indicam! Insistia seu chefe
E ele, naquele estado de sono lúcido profundo, retribuía
-Aham
- Você concorda comigo? Perguntava extasiaste e nervoso, com veias latejantes que produziam no outro, nojo e desespero
-Aham. Respondia
-Está bem. Falava o chefe dando-se por satisfeito antes de sair
"Aham." Com o "aham" vou dominar o mundo. Pensava cansado demais para acender um cigarro, a mão olhava para o isqueiro a dois dedos de distancia e paralisava. "Vou ficar aqui". Começou. E se alguém perguntar "Qual é, malandro, vai ficar aí pra sempre, é?" Vou responder "aham" e eles darão por satisfeitos. Porque todo mundo reclama, mas chega em casa e tem comida pronta, roupa lavada. Eu só tenho uma empregada gorda, que sai mais cedo ás sextas pra não perder o pagode. Acho que é pagode, não sei. Ela diz que eu tenho que ir lá um dia desses, que ia curar essa cara-de-bundagem que dá em mim. Eu respondo "aham" e ela vai embora, feliz da vida pra encontrar os namorados bonitões que ela diz que tem.
Mas que preguiça. Preguiça de levantar daqui. O relógio fica girando assim incansavelmente, gira, gira, parece não ter fim, parece responder "aham" á todas as perguntas do universo.
E fica que nem eu, em estado de diamante, era uma posição de yoga que eu fazia quando era novo. Novo e hippie e com mil namoradinhas que cantavam "help" e tinham tudo dos rolling stones. Uma dizia que ia tatuar o Mick Jagger na peito. Sei lá se ela fez. Tinha olhos meio castanhos.Ou azuis. Não lembro mais.
Todo mundo arruma suas coisas. A hora em que todo mundo arruma suas coisas.
- Se eu vou ficar aqui aqui pra sempre.
"Talvez." Ou melhor. "Aham."

sexta-feira, 23 de março de 2012

Vai, mundo!

Vai, me acorrente e jogue no chão
depois me beije, me de a mão
anda, mundo!
Tire-me do marasmo contínuo
de ser
Esqueça-me por um segundo
pra poder lembrar
chore por alguns momentos
pra poder chorar
vai, mundo!
Me repreenda por persistir
nesta insanidade tremenda
que é existir
Limpe o imundo
da reflexão
coloque-me no fluxo contínuo da contradição
Mas vem, anda
aquece esse todo que me sustenta
eu só lhe peço, mundo
me surpreenda...

quarta-feira, 21 de março de 2012

Crença

Acredito tanto
sou fiel à um olhar, um instante, um sorriso.
Um ser crente de momentos.
E depois de partidas, os suspiros que partem-se com meus
olhos e mágoas que afogam-se disfarçadas
não me fazem arrepender.
Pois se não fosse do viver, de onde tiraria tinta para as palavras?
Testo, pois se não testo, como sei? E insisto, testando-me também.
Surrealista, fatalista, anormal.
Não me resta rir. Nem chorar.
Descrente de todos e de tudo, resta-me acreditar.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Es-crescido

As pessoas crescem. Aflorando seus encantos e desencantos. E me assusto.
Não ao viver, ao olhar. E se cresceu, tempo que também vem comigo, me cresceu também?
Em que escala da escada dos antigos, permaneci refém?
E me calo. Não falo. Só olho, reparo, de longe, desconfiando. Aceitando numa confabulação passiva do vento. Do tempo. Que tanto voa que até esqueço. O dia que não vivi.

Mas viverei. E então olharão para mim e dirão:

“As pessoas crescem. Aflorando seus encantos e desencantos. E me assusto.
Não ao viver, ao olhar. E se cresceu, tempo que também vem comigo, me cresceu também?
Em que escala da escada dos antigos, permaneci refém?
E me calo. Não falo. Só olho, reparo, de longe, desconfiando. Aceitando numa confabulação passiva do vento. Do tempo. Que tanto voa que até esqueço. O dia que não vivi.”

sexta-feira, 16 de março de 2012

Amargo

Antes o destino quisesse e seria simples, passo de uma reconstrução. Mas dizia-se amargo, inconstante, surreal. Não fumava fazia tempos, meses até. Conservava um isqueiro no bolso, talvez por apego ou solidariedade.

E dizia “Foda-se”, com fogo na alma e lágrima nos olhos. Enfatizava: “Que se foda.”

O mundo sorri pra mim, me faz invisível também.

Era sempre um barco, num embargo navegável, manifestação do acaso, causada e construída. O que revela, revela-se, revelava-se.

Mas tem tradução? Tem sugestão? Sugestão de onde cuspir esse amargo que estraga, mofa, desnorteia o pensar. Posso cuspir no mundo? Em um segundo, talvez.

Não posso. Segura. Inspira e não solta. Nem que.

Antes acumulava, mas agora, aonde jogo? Aonde jogo o amargo?

Numa máquina de fabricar palavras comedidas instruídas aceitáveis. Assim mesmo. Cru, sem vírgula. Ou tentado.

E criaria uma fabricação qualquer de instantes e palavras, só pra de longe, nem repleto, nem tentado, alcançar a liberdade. Construir com soneto, repugnâncias e melodias, um “até amanhã” desentendido. Um vulgar refletido. Um que passou reconstruído.

Pois de tantas peças, quebradas, unidas, inacabadamente me perfumo. E presumo.

Mas aonde jogo?

Não o jogo. O amargo.

segunda-feira, 12 de março de 2012

sem-poética-sentimental

Até meio sem razão, eu procurava
esse 'talvez' que morre entre os meios
esse sol que descansa o mês de maio
esses 'todos' que sem sujeito
tornam-se tudo.
Mas de cara, o que tinha
eram os dedos cansados
de colocar em palavras toda uma vida
A música que me salvava nos onibus lotados
a ilusão, o retorno
maya, maya
conserta a postura, olha pros lados
descansa, respira, alinha os chakras.
Disso eu não cansava. Mas tinha um milhão
de luzes que ás vezes cegavam
então vinha tudo aquilo, todos aqueles
que não tinham nome nem porque
todo o resto, todo o tudo
e eu procurava.
Até meio sem razão.
Mas procurava.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Verão

Então o sim, o não
e de qualquer forma
essas que encobrem não deveriam ser transpostas
e sim verdadeiras propostas
da realização que se deve tomar!
Engole-se como antibiótico
degola-se a vida como narcóticos
aborta-se um monte de montes
que juntariam em si mesmo
e que desprezo!
que desespero!
E pelo sim, pelo não
pelo então, vamos lá
como detesto o inverso!
Como me cubro no inverno!
Mas é verão, meu senhor
é verão...

sexta-feira, 2 de março de 2012

Inteiro


Que se desconhece
revelando-se em cada fio de cabelo
embaraçando-se ao pensar
no que cala
desarma
finge dispensar
Haverá um suspeito
um tóxico, atóxico
intoxicado perfeito
despeja por silenciar
não esconde-se nos livros
um abrigo
há de bastar.
Grandioso e repleto
esse todo
que não me basta
necessidade do algo
que encoste
hesite
de olhos fechados
adivinhe o falar
silêncio, silencie
o olhar
e
por perto
por pacto
me trate
conheça
metade
inteiro.
o que restar