quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Caso de amor e morte


Tem uma pessoa que passa o tempo comigo. Quero dizer, dividimos nossa insônia. Não-dormimos juntos.

Declaro de antemão que este "não-dormir" está ausente de erotismo, pois é possível que nosso contato, nem visual tenha sido.

Mas é interessante, pois sentimos o mesmo vento e eu ouço, já faz tempo, o som de sua televisão vazia. Você pode me dizer que talvez ele esteja dormindo e eu lhe direi que não, e direi isso não porque sei, mas porque sinto.

E digo mais, é sozinho.

Mesmo que haja companhia em sua cama, dorme sozinho.

Posso ver daqui seu olhar distante, trocando sem intenção os canais no controle remoto, agora acompanhados pelos sininhos que comprei recentemente, daqueles que se coloca na janela e balança com o vento.

Aposto que de vez em quando, sente também o cheiro dos meus incensos aceita o blues que toca como presente ou oferenda. E sabe, definitivamente sabe, que todo esse conjunto de coisas, desconexas e malucas, brotam de mim mesma traçando o caminho do meu quarto ao seu.

Descarto a possibilidade de já termos nos encontrado, e se pudesse escolher, nunca o faria. Mesmo que fosse rápido, pequeno e que não o soubesse.

Mesmo assim, morreria.

É que todo personagem

morre assim, meio fundo

toda vez que caminha e se depara

distraidamente

com o autor que o escrevia.


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