terça-feira, 16 de abril de 2013

Suicida


Todo poeta é um pouco suicida
Mata-se assim
Tiro a tiro Por poesia
Cada palavra exposta em prosa
Cada reflexo mantido em verso
Impõe em sua alma tal discurso
Que ela própria deixa de cuidar de ser alma
E morre mais um pouco, a cada instante
Pra dar lugar a palavra
Então a alma do poeta vê-se colorida em rimas
Não há rancor, nem sossego, nem amor
Mas há rancor
E sossego
E amor
Na alma do poeta toda palavra mata
Passa a tomar lugar em si
“deixe-me entrar”
  falam elas
E então o poeta é só uma rima
Gigante e suicida
Espírito em uma folha em branco
Daquelas que compõe o pranto
Dos seres que não sabem rimar
Mas poeta que é poeta nem liga pra rima
Não pensa, nem quer encontrar
É que a palavra já virou sua língua
(por isso é desbocado, desalmado, desastrado)
Esse ser descrente e letrado
Saudades tenho do tempo que não falava!
Era um parágrafo novinho em folha
Que tinha em si todos os espaços
possíveis pra despistar
E hoje dados os passos
  da vida desencontrada das metáforas
faço-me um resto de
 poesia em papel abandonado.
Um suicida que desaba nos pingos das letras
E nas janelas das palavras
Um suicida letrado
Mais nada.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

nós gatos


Ser ser humano é um tanto complicado
Se posso escolher
Na próxima vida, venho gato
 Gato que  bem está onde está
E se não está, ainda está bem
Pois é gato
Gato sabe uma palavra
 Mil miaus em entonações variadas
Bem diferente da gente
Que repete e insiste e consente
Mas não mia
 (coisa triste essa de não miar)
E todo olho de gato é bonito
E todo pelo, peludo ou pelado também
Além de tudo, não precisa de nada
Tango, classe, sapato
Tudo isso, de graça, tem o gato
E dorme
E come
E mia
E procria
E eu
Aqui
Sentada
Fazendo poesia.
Troco isso e mais um minuto
Na próxima vida, venho felina. Uma gata!

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Poço


Tantos absurdos
Tantos amores não vividos
Tanta coisa que parou no meio
O mundo deve ter um poço de mágoas
Um poço fundo e desumano
Bebe-se dele água, vira-se ele todo
Esse poço
Que só acalma no desgosto do corpo
E do copo
E dos dias que passam nas máscaras inúteis da felicidade
Todo esse poço
Toda essa gente
Não acredito em pessoas felizes
Elas não existem, são só reflexos
A felicidade é um copo de wiskhy
É ler um bukowski triste
É dançar
Tudo que afasta o pensamento é feliz
Tudo que leva a ele, infelicidade
Eu queria ser ignorante
Eu queria ter outra idade
Eu queria pegar um ônibus
E fugir
Pra bem longe
Pra bem perto do poço
Onde mora a cruel
E fatal

 realidade