quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Manifesto de um poeta

Deixa eu falar uma coisa,
a gente tem muita coisa
muita coisa mesmo aqui dentro
e por isso tudo flui, sufoca
e grita
tudo parece maluquice
porque inventamos revoltas
e amores a primeira vista
porque mantemos os olhos
abertos
pras trevas
e o coração em eterno
afogamento
para a luz
PORQUE NÃO HÁ TEMPO
nem passado
nada desgruda de nós.
Nós definitivamente não superamos.
Não superamos nada.
Nós esperamos e desesperamos.
Mas superar, nunca.
Por isso que da vontade de gritar
e ir embora 
sempre que começamos algo novo.
Porque sabemos que dando certo 
ou errado,
nós não vamos superar.
A questão é que não há o que fazer
se soubesse eu diria, eu faria
Mas não há;
O lance é cuspir, é botar pra fora uma centelha,
é surgir na neve uma borboleta.
É tudo isso, é quase nada.
Mas nunca é resto.
Nós nascemos para espernear
e gritar que o mundo acabou, 
mas não temos coragem de rasgar uma única carta de amor.
A distração é um engano certo.
Vivo nessa vida, 
o vivo luto de matar-se e
renascer-se
a medida que vivo.

 

domingo, 23 de setembro de 2012

Primavera

A primavera é uma moça
discreta e consciente da própria beleza.
Moça que permanece estática,
apenas sendo.
Mas nos passos moveis do que se move
não resiste suas curvas ao vento.
Primavera é início dos tempos,
fim dos temores.
Resistência única que se rende ao 
nascimento e beleza.
Textura delicada pra imagem 
tão duradoura.
Nenhuma palavra é espinho
que baste
pra essa criatura pequena e mágica
Que por fim, é bela sem 
culpa
acaso constante
ordem inegável da natureza.
Eis o momento em que tudo
há de ser belo.
Esse mistério que nega
tempo,poesia e dinheiro.
Mistério que apenas é
Fenômeno atrativo
de todos os olhos.
Pobre são as vistas que não avistam
tal esplendor.
Esse que morre e renasce
pra afirmar a vida.
Manifestação de amor e
partida
(porque amar é partir-se de si)
Beleza imprópria e vaidosa
essa dos amantes e das rosas
Mas que enfeita e entrega uma cadeia
de vivos sabores
O de respirar
e transpirar
a eterna beleza das flores.

domingo, 16 de setembro de 2012

Automovel

http://www.youtube.com/watch?v=O_hk8KVQ4T8&feature=endscreen&NR=1

Tem uma estrada que eu carrego nas costas
Que tem peso e beleza das gaitas de blues
É como esse sofrimento que cria o fechar
De olhos
De quem está longe de casa
Mas vê pela janela
Um mundo
Que dança,
Dança
Dança
E que se não chega a lugar algum
Ao menos tem o alvará de se dizer bonito
Essa estrada que carrego nas costas
Tem um milhão de dúvidas
Que se deliciam nas curvas do meu corpo
Nesse caminho, que fez pacto com a noite
Pode-se dizer sóbrio, sozinho
Esse automóvel que carrega minha alma
Vive cambaleante numa estrada que não para
Disfunções de um trânsito sempre livre
Diga-se de passagem
Quando canso, não há tempo
O motor bombeia vento
Que sopra firme em meus cabelos
Devagar, que gira
E aos poucos tira
Esse gole que mantém o frio
Aquele frio vazio
De quem não sabe
O que encontrar;

domingo, 9 de setembro de 2012

Dama da noite

Não que não haja tempo
ou estrada que leve
é que esta brisa
olha esse vento que acompanha a fumaça
presta que o fluxo é agora
bailando uma canção
no asfalto
quatro mãos que se cruzam no alto
sem nem
sem nem notar
a totalidade que grita
um suspiro que
deve-se sussurrar
perguntam-me vez ou outra
a origem dos versos
mas eles são livres, meu deus!
liberdade que não parte nem chega
e então
apenas são
são almas bailantes no ar
Justos são os que cantam
ao amanhecer
mas nobres são os que não dormem
noite, bela dama triste e inconformada
musa dos errantes e dos poemas
essa mulher que não tem nome
mas carrega em si
todas as camas
Abençoe
benção ao vinho
e os papéis desenfreados
quase caio que me entrego
mas o dia insiste
estacionado no que já foi aflição
momento lúgebre do hoje
comprometido, comprimido, atarefado
 mas o dia todo
é só uma ressaca da noite.

sábado, 8 de setembro de 2012

Subsistência

Minha subsistência 
quebra todas as máquinas da cidade
e parece impermeável 
a medida que cresce
Ela bebe o vinho estragado
e brinda duas vezes ao rei do Baco
que é pra não correr o risco 
de brindar errado
E busca o riso do que
foi trágico
A beleza no que não tem mais
cor
O transe da subsistência
nunca desenvolve no momento
errado
pois não há momento
e não existe errado
É tudo ao mesmo tempo
O canal que grita e absorve
quando vê o controle
se esconde
controle de fala
engasga remoto
engole moeda
e sufoca
Minha subsistência não é
produção nem vitrine
é vivencia e poesia
Respiração ofegante
arte e artimanha selvagem
que assopra e destrói o
moinho
esse que gira manso
e ninguém percebe
esse que atropela meu caminho
Deduzo então que minha subsistência
troca de nome
Mas mantém uma força,
uma essência
é a entrega da noite num salto
é soltar os demônios no
palco
O resto é pequeno e inútil
transitório. sarnento. ilusório
Tão subtraído que já vejo de
novo
Tão repetitivo que cabe no
bolso.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Unha


Olha essas esperanças políticas em tempos de não sei que dia é hoje, e tudo parece tão bonito, porque o sol abriu e meu corpo parece ter medo, porque se esconde aqui, entre suspeitos e segredos, e qualquer coisa fora do caminho, agora parece real e então, menos bonito. Porque comprimidos comprimem minha razão, encontro uma fumaça, um gosto amargo e nada. Onde as paredes visitam as palavras, palavras de despedida, de maus tratos agressivos que se escondem no canto esquerdo da garganta e nada. Nada, nada, nada. Se fosse hoje me confessar com o bar man, o padre sentiria inveja, e conversaria com qualquer um que rejeitasse som, conversaria com um surdo, e com uma cabra. Convenceria o Rei das estradas que não sabem onde vão dar. De que a minha trilha sonora de hoje é tudo que tenha “down” no nome, e olha que nem é domingo. Porque eu poderia ter um livro de histórias gigantescas, e elas resultariam em lágrimas doces e balançariam as estrelas. Mas tem sempre um talvez, tem sempre um nó. Um nó na garganta, um nó no peito, um nó que se forma um coração. Que não é metade nem corpo inteiro. É nada. E será nada enquanto não se movimenta, só sufoca, só aumenta. As palavras mais intensas não compõe, não me componho, me faria de novo, me transformaria em nada, é nada. Nada mais nada menos nada que seja nada que importe nada que viva. Nada que viria hoje me tirar desta imensidão pulsada e cheia de agressividade. Mas assim meu pé fica firme, assim não é tão belo quando triste, pele, carne, unhas, tudo se encaixa, tudo vive um pouco mais quando não há tanta alma.