“É a última estação
do metrô.” Isso era tudo que eu sabia antes de conhecer a Pavuna. Um dia antes
a Patricia, nossa produtora de milagres, me liga para avisar que as crianças
são muito,muito agitadas. Desobedientes, talvez? Não tem problema, como diz Osho:
“Os obedientes nunca são brilhantes”. Mas é preciso estar preparado.
No dia seguinte, uma
agitação tomava conta de todos nós. Quem sabe, era esta mesma agitação que
pertencia a eles, mas que por um fluxo qualquer, nos alcançava. Terça feira. Os
filósofos da vez era eu, Gabriel e Renato.
Quarenta e cinco crianças. Noventa olhos curiosos. E energia, muita
energia.
Quinze crianças vão
com o Renato, que tinha preparado uma atividade com vendas e truques de mágica
e trinta vão comigo e com o Gabriel. Perfeito, o que a gente faz agora? Antes
de mais nada, vamos nos sentar em roda. “Filosofia tem a ver com matemática?”
Alguém pergunta. Aproveitando de uma resposta quase pessoal, respondo. “Não,
filosofia é a ausência de matemática.” Resposta controversa. Mas as crianças
gostaram, com raras exceções, minha fala recebe uma série de aplausos. Contrariado, o outro professor (há esta hora
já havíamos nos tornados professores) pergunta: “Vocês estão aplaudindo o
que?”.
“A gente odeia matemática.” Eles respondem. Num misto de
anarquia e ansiedade, de atenção dispersa e curiosidade constante, o primeiro
assunto que consegui abordar foi o medo. E quantos relatos, quantas questões
surgiam! O que difere o medo da morte do medo da barata? Do que você tem mais
medo? Não tem medo de nada? O que é medo?
No dia seguinte, uma surpresa. Crianças felizes, nos
recebendo com sorrisos e abraços, prontas e dispostas para continuar
investigando o conhecimento. Naquele
momento, não eram mais simplesmente crianças, não eram “todas elas”, era cada
uma delas. Cada uma com seu jeito, sua vontade, sua verdade. É preciso
perceber. Não era eu quem segurava suas mãos, eram elas que me levavam. Para
onde quiserem. Não estava determinada a comandar o voo, estava disposta a voar
com elas. E que viagem! Quantos talentos, quantas ideias que nenhuma pessoa
grande sonharia em ter, quanto brilho, quanta vida!
As atividades fluíam, curiosamente, com uma organização
natural e não imposta. Os momentos eram fruto da vontade, e não da obrigação.
Foram três dias de descoberta, no último, os alunos escreveriam quatro frases
para colocarmos em quinhentos balões vermelhos e jogar aos céus. O resultado
foi emocionante, a cada papelzinho, um novo arrepio tomava conta de mim.
Terminada a atividade, os alunos não queriam embora da
escola. Parece milagre, mas é bom senso. E um aperto já tomava conta de mim. De
todos nós. Filósofos e crianças, crianças e filósofos, há este momento já não
havia tanta diferença entre os termos. No dia seguinte, soltaríamos os balões. Nossos
pensamentos iriam voar!
Sexta feira, último dia. Nos perguntávamos como seria na
semana seguinte, sem o despertador tocando cedo, sendo útil e desnecessário,
quando a própria vontade já nos despertava. Não vamos mais descer na última
estação, onde olhos brilhantes nos descobrem e bocas falantes já sabem nossos
nomes? E as mãozinhas agitadas que agarravam as minhas, dando impulso e me
ajudando a voar, reconstruindo em mim a leveza que as pessoas grandes costumam
perder.
Mas entregamos tantos balões e presenciamos tantas ideias
nascendo, que para mim, descobrir o que sobrou do céu foi tarefa fácil. Não
estava distante, no alto. Estava em cada sorriso curioso que brotava feito
planta do meu lado. Nascia perto, junto.
Antes de ir embora, pergunto para um aluno. “Se você tivesse
que escolher só uma matéria, qual você escolheria?” Muito convicto, ele
responde “Filosofia.”
Os balões tomavam conta do céu. Missão cumprida. A primeira
parte dela, é claro.
“As crianças não
precisam de ajuda, precisam de amor.” Osho
4 comentários:
Me peguei sorrindo no final do texto.......
Vem um sorriso de brinde!
Belo e poético trabalho!Eu diria também que a loucura é um tipo de genialidade. Parabéns! Peguei meu brinde também! beijinhosss
Que bom, seja bem vinda! :)
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