quarta-feira, 9 de maio de 2012

Tem um silencio em mim


Tem um silêncio em mim, pronto pra gritar. Eu digo “doutor, tem alguma coisa estranha aqui.” Faz um barulho forte, que estala os ouvidos. Faz Tum-tum Tum-tum. Mas na verdade é só o reflexo de um silencio, e disso eu sei. Ele diz que não. Eles dizem, rindo, que não. Mas eles estão me enganando, se enganando acreditando que conseguem me enganar. E antes que me julguem, achando-me cínico, esclareço que tento esclarecer seu engano. E aí então uns me olham com olhar longo e rosto virado, sorriso pequenininho no canto da boca, como aquelas crianças de olhos grandes que faziam propaganda de iogurte, e me dizem que não, que estou errado, que não é um silencio, nem um barulho, que é algo bonito que tem dentro de mim e eu digo que não de novo e eles dizem que mesmo que eu negue, será assim.
Não tem problema. Mesmo que me acusem de cinismo, eu sei que não sou. Porque tentei, e não foram poucas vezes, os avisar. Eles que insistem em insistir em tentar me convencer. Mas eles querem me enganar, e disso eu sei. O por que? O porque eu não sei, mas querem. Sim, também acho um tanto estranho e por isso um dia conversei com um rapaz bem magrinho que dizia que tinha um outro moço que ia me ajudar, e que um dia ele ia, vejam essa, brotar no meu silencio. Eu achei bem engraçado, porque ele disse que deveria ter amor ao silencio e eu perguntei como amo algo que não fala e ele disse, fala sim senhor é só ouvir.
Eu dei foi um chega pra lá, porque de maluco já basta todo esse povo que quer me enganar. Então vem o doutor todo de branco, e eu pergunto se ele não gosta de azul verde amarelo rosa e violeta e ele ri, deve ser porque não gosta ou porque não sabe combinar cores, coitado. Aí eu disse que era pra ele não se preocupar, porque tinha um primo meu que era assim também, se vestia só de verde limão que era pra não ter trabalho, era bem inteligente esse meu primo, e todo mundo respeitava, por isso disse que era pro doutor não se preocupar. Então ele riu, porque ficou feliz que eu falei isso pra ele, e tirou alguma coisa metálica de uma mesma maletinha que ele sempre carrega junto e disse “vamos ver esse barulho aí.”
Então eu corrigi. “Não é barulho não, doutor, é silencio. Faz ‘tum-tum’ mas é silencio.” Acho que ele nem ouviu porque colocou aquilo no meu peito e apertou os olhinhos bem apertado assim como se quisesse escutar alguma coisa. Mas eu disse “aí só tem silencio não tem barulho não senhor.” Mas ele nem ligou, continuou mexendo na maletinha dele e eu só não mando embora porque ele gosta da minha companhia, acho que nem amigos têm, é bem sozinho vem aqui me ver quase todos os dias da semana e traz sempre aquela malinha coitado, que nem coisa que presta deve ter.
Às vezes o silencio da um pulo, como fosse pra me convencer que consegue falar. Eu abro os olhos assim, meio arregalado pra ver se consigo escutar. Mas não tem nada não. Aí dizem que eu to errado, que é pra ficar parado, se não alguma coisa vai pular. Como é mesmo que eles dizem, pular pela boca, não, saltar pela boca. Então eu acho graça e respondo logo que se fosse pra sair alguma coisa, era preciso antes estar lá.